segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Coisas de velho…

Quando em 1979 o ditador do Irão Mohammad Reza Palevi, foi derrubado, na Europa olhamos com simpatia para o novo regime que nascia sob a liderança de um Aitolá que vivera exilado em Paris.
Regressado ao país, onde as massas tinham derrubado o Xá Reza Palevi, Ruhollan Khomeini, o Aitolá de Paris, acabou por instaurar o regime dos Aitollás no Irão. É certo que o ditador Reza Palevi foi responsável por uma ditadura inqualificável, porem e no que confere por exemplo ao papel da mulher iraniana, a verdade é que o regime dos Aitollas fez regredir a sociedade iraniana. Mas a nossa confiança inabalável nas massas populares e na sua “sabedoria” preferiu ignorar o que a recepção ao Aiatollá Khomeini deixava transparecer. Os fundamentalistas exultavam enquanto na Europa entoávamos hinos à liberdade que espreitava em Teerão…
Hoje no Egipto o povo na rua exige a “cabeça” de Mubharak. Pressentindo o sentido dos ventos da história a policia desapareceu das ruas e o exercito não sabe bem para que lado cair. Diz-se que poucos serão os que ainda prestam vassalagem ao ditador. Mubaharak parece ter os dias contados.
Consequência da turbulência que varreu da Tunísia a ditadura? Talvez!?...
Os noticiários dizem que amanhã os egípcios querem um milhão de pessoas na rua para expulsar Mubharak do poder.
Na Europa não nos surpreendemos. A revolta popular já era esperada.
E a Europa como vê as manifestações de júbilo e apoteose pelo regresso à Tunísia, onde tal como Khomeini, o líder islamita Rachid Ghannouchi passou os últimos vinte anos?
Provavelmente nem pensamos nisso. Viva a liberdade, abaixo a ditadura. Viva pois então! Abaixo, claro!
As mulheres tunisinas, mas não só – alguns “velhos” europeus também – olham para tudo aquilo com uma certa apreensão.
Mas não liguem, são coisas de velho…
Viva a liberdade, abaixo as ditaduras!

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

No rescaldo das Presidenciais 2011

Ontem, depois de conhecidos os resultados, por diversas vezes manifestei o meu estado de alma: claramente decepcionado com os resultados e muito particularmente com a reeleição de Aníbal.
Escrevi e mantenho que Aníbal, de acordo com as regras da democracia, é também a partir de agora (novamente) o “meu” presidente. Essa qualidade, eu não lhe a posso negar. Portanto Aníbal, é também o “meu” presidente, um presidente que me envergonha, mas ainda assim o presidente que o povo, do qual faço parte, escolheu.
Votei Alegre – Se foi sapo ou não a história se encarregará de o demonstrar! – fi-lo com satisfação e prazer, por duas ordens de razões: Nas circunstâncias presentes Alegre era o homem que mais podia unir à esquerda. Unir não é apenas juntar. Unir é criar laços e bases de trabalho para o futuro. O nosso combate não é apenas eleger um presidente, o combate de hoje é juntar forças para resistir e contra-atacar. Juntar forças, juntar pessoas e procurar plataformas mínimas de entendimento, com os partidos ou sem eles, mas nunca contra eles. Alegre era o homem que no espaço, que em minha opinião congrega mais potencial para alterar o estado a que chegamos, mais unia. Esse espaço crítico, situa-se algures, sujeito a melhor análise, na massa eleitoral que anda entre o PS e o Bloco. Dir-me-ão que há mais povo para além dessa massa eleitoral. Claro que há e eu quero chegar até ele. Mas para isso é preciso maior consistência e solidez eleitoral – critica tanto melhor.
As grandes mudanças não se fazem com eleitorado sem memória, criticista, que não critico, capaz de correr com os Anibeis para depois, escassa dezena de anos depois, lhe oferecer a presidência. Como não se fazem com eleitores que elegem anos e anos a fio os “tiranetes” – refiro-me aos eleitores madeirenses – e depois votam da forma como o fizeram na candidatura de José Coelho. Igualmente o eleitorado volátil ou o ortodoxo não se revelam capazes de constituir bases sólidas de sustento a qualquer mudança. O primeiro pela sua própria natureza, o segundo pelo seu cansaço e definhamento.
Neste contexto Alegre era em meu entender o elemento que podia unir no espaço a que me referi, mais gente. Por isso recebeu o meu voto. Mas há outra razão para isso e essa tem que ver com a dimensão cultural dos candidatos. Alegre tem essa vertente cultural a par de uma componente de resistência – quando resistir era difícil – que para mim faz toda a diferença.
No que confere à personalidade o senso comum, ou a lógica popular manda que entre a formiga, aforradora e trabalhadora, e a cigarra supostamente negligente e festeira, a escolha se faça em favor da primeira. Mas a lógica por vezes é uma batata. Eu não me dou bem com as formigas, até porque, apesar de terem a dispensa cheia, não são mais felizes que as cigarras!
Por ultimo e antes de linkar para o artigo de opinião de Baptista Bastos, no rescaldo destas eleições, artigo que subscrevo integralmente, reafirmo a minha gratidão ao poeta candidato que nesta hora difícil, mas é nas dificuldades que os políticos se afirmam, aceitou o desafio e corporizou uma candidatura com o norte na defesa das liberdades e na defesa do estado social.
OBRIGADO MANUEL ALEGRE!

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Peças do 'puzzle'



por BAPTISTA-BASTOS

Mário Soares foi o vencedor das eleições. A astúcia e a imaginação do velho estadista permitiram que Fernando Nobre, metáfora de uma humanidade sem ressentimento, lhe servisse às maravilhas para ajustar contas. É a maior jogada política dos últimos tempos. Um pouco maquiavélica. Mas nasce da radical satisfação que Mário Soares tem de si mesmo, e de não gostar de levar desaforo para casa. Removeu [continua]

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Cesare Battisti

Activista na Itália dos anos setenta. Preso em 1979 e condenado a doze anos de prisão, conseguiu fugir em 1981 e refugiou-se em França e depois no México, onde iniciou a sua actividade de escritor. Em 1982 foi denunciado por um arrependido — ou seja, alguém que em troca de denúncias beneficiava de uma redução da pena — por crimes que não cometeu. Julgado à revelia na Itália em 1988, foi condenado à prisão perpétua com privação da luz solar. Durante a presidência de François Mitterrand regressou a França, onde os tribunais recusaram a sua extradição para Itália. Em França Cesare Battisti continuou a actividade de escritor. A sua situação mudou durante a presidência de Jacques Chirac e, na eminência de ser extraditado para Itália, Battisti conseguiu fugir. Foi preso no Brasil em 18 de Março de 2007. O ministro da Justiça concedeu-lhe asilo político, mas o Supremo Tribunal Federal opôs-se e manteve Battisti na prisão. No último dia do seu mandato, o presidente Lula decretou que Battisti não seria extraditado, mas o Supremo Tribunal Federal continua a manter Battisti preso.

Várias pessoas que no Brasil têm estado activas na defesa de Cesare Battisti temem que o Supremo Tribunal Federal opere um verdadeiro golpe de Estado judicial, ponha Cesare Battisti num avião e o envie para Itália. Há também os optimistas que desde há dois anos dizem que Cesare Battisti será libertado amanhã, se não mesmo hoje.

Mas o que sabemos é que, enquanto Cesare não for libertado, está preso.
Para saber mais sobre o caso de Cesare Battisti leia aqui um relato escrito por ele e leia aqui um dossier de artigos.

Comissão de Defesa de Cesare Battisti

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Cavaco homem de fé homem de mão

por Mário Tomé a quinta-feira, 13 de Janeiro de 2011 às 0:37

O Cavaco é um aldrabão. Um seguidor do Antigo Testamento. O Homem de mão da finança.
Cavaco é um tipo que os criminosos da finança querem como presidente, como o Dias Loureiro,e que beneficia de privilégios só possíveis pelo crime financeiro de gajos como o Oliveira e Costa.


Leia na integra o artigo de Mário Tomé, aqui 

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O manto inócuo da unica verdade e da pureza mais pura!

Não me surpreende, já conheço a retórica, ainda assim incomoda-me a rigidez de pensamento, para não escrever “formatação” do candidato presidencial apoiado pelo PCP, Francisco Lopes.
É certo que as perguntas de Maria Flor Pedroso não são inocentes, já o disse várias vezes e mantenho, porem um candidato da esquerda que se preze, tem que ser capaz de dizer, tem que ter a GRANDEZA DO POVO DE ESQUERDA e saber discernir, que mais que o interesse partidário, mais que o projecto individual, mais que o sonho pessoal se quiserem, mais que tudo isso está a sorte de um povo, a defesa e manutenção do estado social, a garantia das liberdades publicas e individuais, a luta contra a especulação e a ganância do capital e dos empresários sem escrúpulos que não dos sérios, a defesa e manutenção dos direitos duramente conquistados, etc, etc…
Quando Maria Flor hoje lhe colocou a questão: «Se numa hipotética segunda volta com Cavaco Silva, não for Francisco Lopes o adversário do candidato da direita, em quem votaria.» Lopes, no melhor estilo ortodoxo da liderança do PC recusou responder.
É certo que ele tem o direito de recusar esse cenário, tem o direito de tudo fazer para ser ele a estar presente, tem o direito e o dever de lutar pelas suas convicções, não tem é o direito de brincar com a nossa inteligência e muito menos com os valores da esquerda.
Francisco Lopes, assim não vamos a lado nenhum. Essa é a tese que o seu partido tem feito vingar no sindicalismo e de um modo geral nas colectividades e associações onde intervenção, e os resultados meu caro Francisco, têm sido invariavelmente vitórias pessoais e derrotas colectivas. Para quem defende o colectivismo convenhamos que o resultado não abona em favor da ideia.
Mas cada um é que sabe os caminhos que tem para trilhar.
No próximo dia 23 espero não assistir à expiação das culpas pessoais na prestação dos outros candidato. Espero não ver Cavaco pavonear-se pela passadeira que a cegueira politica e ambição desmedida de uns quantos lhe estendem, alicerçando de forma estruturada o velho sonho de Sá Carneiro: «Um presidente, uma maioria e um governo» e ao invés quero ver a cara de pau de Cavaco a reunir as hostes da direita para enfrentar na segunda volta o opositor a esse seu projecto, seja ele qual for.
Todos sabemos que o PCP, entre Cavaco e outro dos actuais candidatos, nomeadamente se esse outro for Manuel alegre, não hesitará em Votar Contra Cavaco colocando a cruzinha no quadrado certo. Caramba o batráquio Soares era bem mais indigesto e Cunhal deglutiu-o e exortou igualmente os comensais comunistas à degustação.
O afunilamento de Francisco Lopes em torno de si próprio, rotulando tudo e todos de responsáveis pelo estado a que chegamos, não valorizando uma ideia, uma proposta, uma só que seja dos candidatos que do ponto de vista ideológico podem estar mais próximos de si, nomeadamente de Manuel Alegre, reclamando como seu, e apenas só seu, o manto inócuo da unica verdade e da pureza mais pura, está a correr o risco, arrastando consigo o PCP, de não ser levado a sério. Isso não é bom para a esquerda e será sem duvida um grande trunfo para Cavaco.

Senil ou peão?

Ontem numa manifestação de apoio a Fernando Nobre, Edmundo Pedro acusou Sócrates de instaurar um clima de medo no PS. Seria essa a razão pela qual muitos socialistas que apoiam Nobre, mantêm um prudente silencio.
Há, no PS, muita gente dependente de Sócrates, acrescentou o ancião. Lembro que Edmundo Pedro já vai nos 92 anos de idade, talvez essa provecta idade justifique as declarações, algumas meio patéticas que nos últimos tempos vem proferindo.
Não me cabe, jamais o farei, defender o líder da escalada neo-liberalismo nosso país, José Sócrates de seu nome. Não é uma questão de simpatia, ou de carácter – ou da falta dele – que me opõe a Sócrates. A política e apenas ela, me faz rejeitar Sócrates. O carácter sendo importante, perante o pragmatismo que a politica requer, até pode ser uma questão de somenos. As mentiras, as contradições e tudo o mais que o caracteriza sendo relevantes e porventura inibidoras de um putativo apoio, são ainda assim secundárias perante o descalabro a que o “Estado Social” que diz defender chegou; irrelevantes perante a realidade do corte de salários; desprezíveis mediante o estado da economia; uma gota de agua no oceano perante o buraco do BPN, etc, etc…
Não é o carácter de Sócrates que está em causa nesta minha apreciação às declarações de Edmundo Pedro ontem numa acção de campanha de Fernando Nobre. Não! Isso está fora de causa e só mentes malévolas ou dementes o poderão admitir.
Posto isto quero lembrar que Edmundo Pedro em Fevereiro de 2009 fez exactamente declarações análogas que logo desmentiu. Em 5/2/5009 ‘O Publico’ referia que «O histórico do PS Edmundo Pedro afirmou ontem numa reunião socialista na sede do partido, no Largo do Rato, em Lisboa, que dentro do PS há quem não se pronuncie sobre a vida interna do partido porque tem medo Pouco depois em 28 do mesmo mês ‘O Sol’ escrevia que «O histórico socialista Edmundo Pedro afirmou hoje que as notícias sobre as suas declarações alusivas a um clima de ‘medo’ dentro do PS basearam-se ‘numa fantasia e especulação puras’.»
Afinal em que ficamos? Há medo, não há medo, há assim, assim?...
Se a estas piruetas cruzarmos a história de 1978, quando foi apanhado com uma carga de armas de guerra com as declarações que ontem também terá feito tentando envolver naquela tramóia outras pessoas, nomeadamente o candidato que apoiou nas ultimas presidenciais, facilmente deduzimos que o homem ou está senil ou é mesmo um peão a soldo de alguém.
No que confere as armas de 1978, convém esclarecer que não eram as G3 que Otelo terá declarado estarem “em boas mãos”, estas ao que se disse terão sido distribuídas pelos vencedores do 25 de Novembro, não fosse a coisa dar para o torto.

sábado, 8 de janeiro de 2011

NISA: GENTE DA MINHA TERRA


Este texto, que retirei do Portal de Nisa, faz o relato na primeira pessoa dos trágicos acontecimentos vividos em Nisa em 1943. Acontecimentos esses que a excelente contadora de histórias que foi a Isabel Dinis, falecida em 2006, me contou logo nos primeiros anos que frequentei a sua casa. Em sua memória "roubo" o texto ao Mário Mendes e reproduzo-o aqui.
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NISA: GENTE DA MINHA TERRA

A “Revolta do Pão” de 1943 em Nisa contada por quem a viveu: Manuel Bugio

Já passaram 67 anos, mas o episódio da “Revolta ou Greve do Pão” no dia 12 de Dezembro de 1943, uma das páginas mais negras e sangrentas da história de Nisa continua viva na memória daqueles que presenciaram ou tomaram parte no acontecimento.
Manuel do Rosário Carita ou Manuel Bugio como é conhecido em toda a vila, lembra, aos 84 anos de uma vida de encontros e desencontros, o que se passou nesse “dia negro” e nos meses seguintes. Relato na primeira pessoa, com pequenas “entradas” de contexto.

Domingo de festa e de tragédia

“Era domingo e havia baile no “Benfica”. Estive a namorar uma cachopa na “vila” e quando vim de lá deparei-me com uma grande algazarra no Rossio e pus-me a observar o “panorama”.
O povo dizia que tinha vindo o Manuel Vigora com o pão para a padaria do senhor João Mendes na Porta da Vila. O padeiro meteu o pão dentro da padaria e depois não o venderam a toda a gente, só a quem queriam. O pão estava quase todo encomendado, pois estavam lá as bolsas e aí o povo conspirou. Foi ali que começaram o barulho. Alguns, mais exaltados tentaram forçar a porta e sacar o pão que pudessem.
Daí vieram para o Rossio onde o povo se juntou. A multidão era cada vez maior e logo ali a GNR prendeu o ti Simplício Tristão e levou-o para o posto. O homem não tinha nada a ver com o protesto e alguém se lembrou de tocar os sinos a rebate, enquanto outros falaram com um vereador da Câmara para que o ti Simplício Tristão fosse libertado, o que veio a acontecer.
Mas isso não impediu que o povo acalmasse a sua revolta. O movimento engrossou e do Rossio as pessoas dirigiram-se à “fábrica” ao fundo da Devesa de onde tentaram trazer pão.
Depois subiram a Devesa de Traz e dirigiram-se para a Estrada de Alpalhão. Havia baile no “Benfica” e alguns ficaram-se por lá, mas os outros foram em frente e dirigiram-se à padaria do Vigora. É ali, a meio da Estrada de Alpalhão, junto à padaria que se dá o desfecho sangrento. De um momento para o outro, surgem guardas e polícias vindos de Portalegre que começam a disparar sem qualquer aviso. Cada um fugiu para onde pôde. Houve feridos ligeiros e dois feridos com gravidade. Um deles, o João Louro, que nada tinha a ver com aquilo, foi ferido numa perna que teve de ser amputada. Outro, o ti Alfredo Mourato “Galacho” foi ferido nas “partes” (órgãos genitais) sofreu muito e acabou por falecer ao fim de uns meses.”
Não houve presos nessa noite, mas no dia seguinte, a repressão abateu-se sobre inúmeras pessoas, a torto e a direito, tivessem ou não participado naquilo que a acta da sessão da Câmara de 16 de Dezembro descreve como “alteração da ordem pública”. Uma simples suspeita, um nome ouvido à socapa ou a denúncia de alguns dos comerciantes alvo da indignação popular, bastaram para que, em pouco tempo, a cadeia se fosse enchendo de gente que mais não fizera do que pedir um pouco de pão para os seus.
Manuel Charrinho, trabalhava nas minas de volfrâmio no Mato da Póvoa. Foi o primeiro a ser preso, ainda o sol não nascera, nessa fria manhã de 13 de Dezembro. Preparava-se para partir, de fatada aviada para mais uma semana de trabalho, mas a PSP de Nisa deu-lhe como primeiro destino a cadeia comarcã. Outros se seguiram nesse dia e durante toda a semana.
Manuel Bugio, o nosso interlocutor, não escapou às “boas graças” das autoridades policiais da vila.
“Andava a fazer lenha e vim buscar água à “Sucata” (uma serração onde está hoje a secção de Finanças). Nessa altura vinha o Vigora trazer pão à padaria e diz-me: “Tu ainda aí vens?” e eu respondi-lhe – “ Atão onde é que devia estar?
Passado pouco tempo veio a polícia buscar-me. Alguém tinha dado o meu nome e sem saber porquê fui “engavetado”, levado para o pé do ti Manuel Charrinho. Durante a semana foram chegando mais presos, ao todo perto de 40 homens, ali despejados a monte, sem condições, cada um dormia como podia, uns no chão outros de pé. Estávamos incomunicáveis, as famílias iam-se revezando durante a madrugada para saber se nós ainda lá estávamos. Não podiam contactar connosco e iam deixando alguma coisa, contando com a benevolência do carcereiro, o ti Manuel Ramos.
Ao fim de 10 dias vieram 2 camionetas de Portalegre que nos levaram para os calabouços do Governo Civil. Estivemos lá 41 dias, incomunicáveis, e todos os dias havia interrogatórios.
Queriam saber quem era o “cabecilha” do movimento, coisas da política, e todos nós dizíamos o mesmo: não percebíamos nada de política, eu muito menos, porque só tinha 17 anos e que aquilo que acontecera fora apenas uma revolta por causa da falta de pão, feita extemporaneamente, sem cabecilhas ou lá o que fosse. Era domingo, único dia da semana em que os trabalhadores rurais e assalariados tinham livre e aproveitavam para se juntar e beber uns copos. Nos calabouços do Governo Civil estávamos a “monte”. As necessidades eram feitas no mesmo sítio. Não recebíamos visitas. Os familiares iam lá mas não podiam ver-nos, deixavam o que levavam para nos ser entregue.
Eram tempos de muita miséria e o Natal de 1943 com os principais activos das famílias presos foi uma tragédia, com muita dor e tristeza.
Os interrogatórios no Governo Civil fizeram uma selecção e ainda hoje não sei porque fui “escolhido” para me juntar aos 17 homens que fomos para Caxias.
Atravessámos a cidade de Portalegre a pé e a pé, em pelotão, continuámos até à estação, vigiados por polícias armados como se fôssemos uns criminosos. Foi das coisas que mais me doeu e marcou, o ter de atravessar a cidade sob o olhar das pessoas. Mais tarde compreendi que isso fazia parte da estratégia do regime para mostrar o medo e o terror e apontar-nos como maus exemplos.
Seguimos de comboio para Lisboa, sempre rodeados de polícias até à sede da PIDE onde houve mais interrogatórios e daí fomos levados para o forte de Caxias. Fomos fotografados, um a um e de novo interrogados.
Estivemos um ano em Caxias e só depois é que fomos julgados no Tribunal da Boa Hora. Sete dos que ficaram em Nisa também lá foram para ser julgados. O doutor José Rasquilho de Barros, de Amieira do Tejo, foi o nosso advogado oficioso e testemunharam a nosso favor, os doutores Carlos Bento e Aniceto Ferreira Pinto, farmacêutico na Porta da Vila.
Todos eles disseram o mesmo, que éramos pessoas de trabalho e nada tínhamos a ver com políticas. O dr. Rasquilho de Barros pediu por Deus ao Juiz que nos pusesse em liberdade e que desse a pena como cumprida àqueles que tinha vindo de Nisa, pois que para sofrimento das famílias já chegava.
Saímos do Tribunal direitos a Caxias onde dormimos mais uma noite. Os nossos camaradas que tinham vindo de Nisa tiveram de cumprir uma pena de sete meses e foram ocupar os nossos lugares. No dia seguinte saímos em liberdade e cada um ficou entregue à sua sorte.
Para mim, acabara um grande drama. Tinha uma boa “cunha” para ir para a polícia, tal como outros para funções públicas, entre eles o Vasco Barra que já tinha o exame feito para entrar e a partir dali ficou chumbado.”

Os meses no Forte de Caxias

“Não posso dizer muito mal de Caxias, o que não aconteceu com outros que foram maltratados. Era faxina dos próprios guardas que nos guardavam a nós e também fazia trabalhos de jardineiro. Os outros iam trabalhar para o forte em trabalhos mais pesados. Tínhamos 2 horas de recreio e estávamos separados dos outros presos políticos, na sala 9, a sala dos nisenses. As famílias em Nisa sofriam, as mulheres e os filhos tinham os homens e os pais presos, os seus únicos sustentos e não os podiam ajudar. Os dois homens solteiros no grupo, era eu e o António Veredas.
Não posso dizer mal dos guardas de Caxias. Sabiam que não estávamos ali por motivos políticos, muitos deles eram pobres como nós e tinham passado pelas mesmas situações de miséria. Fomos dados como “faxinas” do forte e pessoas honestas.”

O regresso a Nisa

“ No regresso a Nisa fomos bem recebidos, com muita alegria e lágrimas à mistura. O pesadelo para nós, não para todos, tinha acabado. Os que trabalhavam no campo continuaram a trabalhar, sem problemas. Aqueles que esperavam entrar para um trabalho no Estado, anos mais tarde foram para França, como eu fui e acabaram, através de muito esforço, por ter direito a reformas dignas que, se calhar, cá não tinham conseguido.”
O que foi a “Revolta do Pão”

Greve do Pão ou Revolta do Pão, o episódio sangrento de 12 de Dezembro de 1943 marcou, por muitos anos o imaginário dos nisenses. O que se passou nesse dia foi sendo esquecido por muitos daqueles que nele participaram. Poucos quiseram avivar a memória e, quando o faziam, contavam, apenas, fragmentos e pequenas histórias do que acontecera.
Manuel Bugio tem a sua própria versão dos factos e não teme contá-la.
“Não houve nenhuma revolta ou greve do pão. Nada foi organizado. Era domingo e dia de mercado. O povo juntou-se no Rossio e na Porta da Vila e os populares, com um copo a mais, indignaram-se quando viram chegar o pão a uma das padarias.
As pessoas naquele tempo viam-se “negras”. Os pobres eram “massacrados”, estávamos em plena guerra mundial, vivia-se à míngua de tudo e o pão foi o “rastilho” para que as pessoas dessem largas à indignação. Política? A maioria das pessoas eram analfabetos e com a miséria que havia quem é que se metia em política? Quem fez disso um caso político foram as autoridades e a repressão a tiro na Estrada de Alpalhão. Eu perdi um ano da minha mocidade, mas ganhei outros e fiquei a perceber melhor a podridão que existia em Portugal.
Mas, o que lá vai, lá vai. Quero é acabar os meus dias em paz e sossego, vir até aqui ao Rossio e rir-me de muitas das histórias que os meus amigos me contam.”

Mário Mendes in "Fonte Nova" - 4/1/2011

FOTOS

1) Manuel do Rosário Carita (Bugio)
2) Porta da Vila (Anos 40) – Local onde se iniciou a “Revolta do Pão”
3) Senha para a tristemente "famosa" Bicha do Pão

Este texto foi retirado daqui

Porque não questiona Judite de Sousa, Durão barroso acerca do seu sinuoso percurso político?

Judite de Sousa enquanto pessoa, não me é antipática. No que confere ao seu trabalho como jornalista e entrevistadora, tem dias… Isto para dizer que, por princípio nada tenho contra a senhora, porem ontem na entrevista a José Manuel Coelho, acho que se portou muito mal.
Na entrevista foi notória a tentativa de retirar credibilidade ao candidato madeirense, explorando negativamente, a irreverência em que assenta campanha do candidato. É certo que o homem, tem aspectos contraditórios, um percurso algo sinuoso. Isso, esse seu percurso apenas o pode diminuir aos olhos dos portugueses, a jornalista jamais deve usar essa, diria fragilidade, incongruência, para reduzir e descredibilizar o candidato.
Vir da esquerda para a direita, e o contrario embora sem grande significado, não é caso virgem em Portugal. Há até quem tenha saído da extrema-esquerda e tenha chegado a líder do PSD e a presidente da Europa. Estou a referir-me a Durão Barroso. Judite já o entrevistou e nunca o questionou sobre o seu percurso político. Então porque o fez com José Manuel Coelho?
Políticos e outros que vieram da extrema-esquerda, da esquerda para a direita e para o neo-liberalismo são mais que muitos, então porque não os convida Judite de Sousa e lhes exige esclarecimentos.
Querem nomes?
Ai vão alguns: Pacheco Pereira, Zita Seabra, José Manuel Fernandes, Nuno Crato, João Carlos Espada, etc…
E tem os que aprenderam o “B”, “A” “Bá” da política com o PCP e depois foram pregar para outras freguesias, mais próximas do poder, ou mais acessíveis ao poder. Não, não é só a Zita, foi o Mário Soares, ou Manuel Alegre por exemplo…
Seriedade precisa-se, no jornalismo também isenção.
Se o putativo Candidato Vieira, dos “Ena Pá 2000”, tivesse tido capacidade para recolher as assinaturas necessárias e viesse a figurar no Boletim de Voto, como é o caso de José Manuel Coelho, Judite tentaria ridicularizá-lo? Claro que não…
Convenhamos, a irreverência também é boa e má… é conforme, né… senhora jornalista?
Longe de mim, valorizar a atitude de José Manuel Coelho e do seu grupo ao alugarem o PND, para fazerem intervenção politica. Não aprecio, não valorizo e até repudio. Porem a jornalista não se pode escandalizar com a “barriga de aluguer” como Coelho se referiu ao PND.
Cristiano Ronaldo para ter um filho fez precisamente a mesma coisa, será que se um dia for entrevistado por Judite de Sousa ela se mostrará igualmente escandalizada por esse facto?
É certo que não. Então porque o fez com este madeirense, porventura menos ilustre?

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

António Pinto Barbosa, a fiscalizar as contas públicas. Se não fosse trágico era para rir.

Mais uma vez a santa aliança entre o PSD e o PS, ou entre Les Enfants Terribles Passos Coelho e José Sócrates, funcionou em desfavor do interesse público.
À mulher de César não basta ser séria, tem também que parecer. Eu não sei se o homem é sério, ou se para nossa desdita é mais um, a verdade é que António Pinto Barbosa foi durante mais de uma década responsável pela fiscalização das contas do BPP e a verdade é que o banco faliu, isto é: António Pinto Barbosa não conseguiu, não quis ou não soube verificar o descalabro daquele banco.
Não soube ou não quis ou… FOI INCOMPETENTE.
O prémio é, na sequência do entendimento entre o PS e o PSD para aprovação do orçamento FeMIniano, ir fiscalizar agora as contas publicas.
Faz lembrar o Victor Constâncio; Este enquanto presidente do Banco de Portugal não previu, não fiscalizou, nada fez como lhe competia para travar aquela gente que estava no BPN, como prémio foi para Vice-Presidente do Banco Central Europeu.
E depois há calhordas que ainda querem que a gente os leve a sério, que façamos sacrifícios e o diabo a quatro…
P… que os pariu! Não fiscalizou com rigor o BPP como era seu dever porem é a pessoa que reúne consenso para fiscalizar as contas do Estado. Dá para entender…

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Quem será o pai vs mãe da criança?

Parecer do "pai" da Constituição diz que cortes salariais de 2011 não ferem o texto fundamental da República.
Imprensa de hoje
(Por “pai” leia-se Jorge Miranda)


Esta coisa dos progenitores da constituição já cheira mal.

Acotovelam-se todos para receber o abono, todos querem ser os pais da dita. O que vale é que o descrédito a que a coisa chegou já não afecta ninguém.

A paternidade da Constituição lembra-me sempre aquela anedota do militar que queria passar uns dias em casa e resolveu apresentar como justificação que o pai faleceu. Fê-lo por diversas vezes embora de forma espaçada e a coisa resultou sempre.

«Mê sargento, recebi agora mesmo a noticia que o meu pai faleceu.»

De imediato o graduado mandava passar a guia de marcha e o magala lá ia passar uns dias a casa. Espantado com tanta sorte o militar um dia resolveu “matar” a mãe:

«Mê sargento, a minha mãe faleceu.»

O sargento apresentou-lhe os pesamos e deu-lhe nova guia de marcha até à santa terrinha.

O problema surgiu quando ele voltou a "matar" a mãe, ai o sargento retorquiu:

«Pais terás vários, muitos até, não conheço a tua mãe e não sei com quantos homens se deitou, mas mãe, boa ou má só tens uma.»

E o "espertalhão" do magala apanhou dois meses de prisão disciplinar.

Por cá, ou na real, tratamo-la,  à Constituição, como se fosse uma meretriz... e é pena a nossa Constituição sendo séria, deveria ser tratada como tal, a começar pela paternidade…

Quem não tem vergonha todo o mundo é seu.

Cavaco diz apresentar-se de "consciência tranquila e cabeça levantada"
DN de 5/1/2011

Não me espanta  que Aníbal, porventura a personalidade mais inculta que um dia entrou no palácio presidencial, diga depois das dúvidas que imperam sobre os seus negócios que está tranquilo.
Ele até pode estar tranquilo, eu é que não fico nada satisfeito com um candidato a presidente que se recusa a esclarecer dúvidas em nome de uma qualquer superioridade moral. Aníbal não tem créditos para tal invocação, tanto mais que no que à cultura confere Aníbal enfim… Como diria Baptista Bastos ”é um político severo, austero, hirto e denso” mas não “um homem culto, lido, cordial e descontraído”.
Calhando estamos falando de conceitos de consciência diferentes.
Vá lá saber-se o que entendem certas pessoas por consciência?
Aníbal, por desdita nossa, pode ser apenas um incidente na nossa vida colectiva, talvez seja mesmo uma grotesca representação de um povo sem tino ou até uma mera contingência politica negativa – Com responsabilidade de Soares e Sócrates. – mas jamais se pode furtar às responsabilidades, ou a esclarecer as duvidas que se levantam em torno da sua saúde económica.
No que confere à ética e à moral não é concebível, admissível ou justificável que se distancie dos amigalhaços – de alguns – como se de maçãs podres se tratasse. Sabemos como lidou com Santana, a “má moeda”, bem como com os que suportaram o fardo em que transformou o PSD após 10 anos de poder. Aí, mas não só, portou-se muito mal, sem ética e sem solidariedade. Mas esse é um problema dos militantes do PSD, eu como não sou militante nem próximo, não me imiscuo na vida interna daquele partido.
Porem as suas amizades e relações com os homens do BPN, tendo em conta os crimes perpetrados por aquela gente, já configura uma questão nacional. Questão nacional, porquanto em função das contingências da luta politica e da ambição desmedida de alguns, fizemos dele o Presidente da nossa República.
Em nome dessa contingência ou da nossa desdita, Aníbal tem que prestar contas, tem que esclarecer, tem que falar. Mais que invocar tranquilidade e consciência tem que por preto no branco.

[Também editado em "O sono do Monstro"]