terça-feira, 23 de novembro de 2010

A manifestação não é destes… pois, deu para entender!

Segurando o "rebanho", ainda não estána hora de entrarem.
Na última manifestação pela paz, na qual por razões particulares não participei, a policia cercou literalmente uma parte dos manifestantes, como se estes fossem um bando de arruaceiros e criminosos. Para o efeito contou com a conivência e complacência dos organizadores, ou parte destes. Esta postura, dos polícias e da organização, incomoda-me. Dos primeiros, dos polícias enfim… já estou habituado, não me espanta – é a natureza desta polícia; sempre, sempre ao lado dos… dos coisos, pronto! – da organização, enfim… não é o habito [que também faz o monge!], que me incomoda, é também da sua natureza. Porem o que me dói na alma é esta propensão para o rotulo, para a divisão entre os bons militantes e os maus militantes, entre os manifestantes ordeiros e os manifestantes desordeiros, entre os camaradas disciplinados e os camaradas indisciplinados, entre os do sacrossanto Partido [o nosso, claro!] e os outros [dos outros, evidentemente!] diabólicos.


Mantendo o rebanho (na) em ordem. Ordem, claro!

Na última grande manifestação em que participei, também assisti incomodado, à tentativa, dos organizadores, de colocarem na ordem e disciplinar, um sector dito anarquista, que manifestava o seu desdém ao sistema, sem contudo obedecer a tutela, fazendo-o à sua maneira e de acordo com as suas próprias convicções. Escrevo tentativa, porque foi infrutífera – talvez porque os choques não se mostraram tão solidários com a organização e deixaram a iniciativa aos organizadores. Os manifestantes, aqueles manifestantes, ainda que no rebanho, não encarneiraram e fizeram ouvir o seu sentir e o seu protesto. Eu próprio, que não subscrevo a actuação do grupo em causa, senti-me impelido a manifestar a minha desaprovação pela actuação dos “funcionários” e até a corroborar, como forma de solidariedade, as palavras de ordem daquele sector. Convenhamos que no que confere ao anti-capitalismo que eles exaltaram, não lhes dou meças, eu reivindico igual estatuto, sou também profundamente anti-capitalista e não estou absolutamente seguro, nem certo de que o meu trilho é o melhor. Sei que é um caminho, um dos diversos caminhos para almejar a justiça social.

Curiosamente, os “polícias sindicais”, que quiseram colocar na ordem os manifestantes ditos anarquistas, eram os mesmos que “policiaram” e controlaram a entrada do sector identificado com o Bloco no Marquês e ai o retiveram com desmesurada presença, mediante um cordão humano [de braço dado e tudo] que mais parecia a vedação de um campo de concentração. Enfim, praticas absurdas que persistem num meio onde uma certa ortodoxia é dominante e se considera a si própria, como a portadora da verdade e a detentora em exclusivo do direito de combater o capitalismo.

Desta manifestação pela paz, no passado dia 20, martela-me ainda na cabeça a justificação, para aquele aparato policial, dada por um oficial da polícia. Disse ele: “A manifestação é da CGTP, não é destes…». E, assim fiquei a saber que os senhores agentes, têm um qualquer registo cadastral que separa as pessoas por serem ou não serem da CGTP, por serem destes ou por serem daqueles, por serem dos outros ou não serem dos outros…

Que estes? Que outros?

Evidentemente que não confundo sindicalismo, com estas atitudes, nem confundo a CGTP com estas praticas. Acredito que o movimento sindical em torno da Inter, é fundamental, crucial mesmo, para alterar o rumo que a nossa vida está a tomar. Porem a democracia interna e o respeito pelas minorias internas e externas, mais do que uma postura magnânima, dotada de uma certa generosidade ou moda, deve ser uma marca identitária, tem que ser assimilado e passar a fazer parte do código genético do sindicalismo.


E não é que têm razão?!
No que confere ao movimento anarquista – que os fazedores de opinião persistem em emparceirar com vulgares delinquentes e, ou meros agitadores sociais ao sabor da corrente. – inclino-me perante a sua persistência e determinação. Por outro lado, repudio a rotulagem [Muito ao estilo fascista de “quem não é por nós é contra nós”.] anarquistas ou não, muitos destes jovens trilharam milhares de quilómetros para manifestar o protesto contra os senhores da guerra, que têm, esses sim causado toda a espécie de desgraças, por onde passam. Quem de nós, cinquentões mas não só, se dispõe a esse gesto de cidadania que assenta na rebeldia e determinação dos jovens – Que já fomos! – e se dispõe a afrontar os responsáveis pelo estado a que chegamos, estejam eles onde estiverem?

Exige-se pois em nome do nosso futuro e até da humanidade mais respeito por estes jovens!

Por ultimo uma referência breve ao movimento anarco-sindicalista dos primórdios do século passado, o qual está incontestavelmente ligado ao sindicalismo mais democrático, combativo e, já agora, mais culto de que há memória, lembrando que do movimento, ou no movimento, anarco-sindical pontificaram verdadeiros lideres – parece paradoxal, lideres… – da classe operária, que se empenharam fortemente na luta pela sua emancipação, sobretudo no período da, também diabólizada primeira republica.

Quão diferentes eram as sedes sindicais, desse então. Onde hoje está o recebedor de cotas estava então a biblioteca; onde hoje se faz aconselhamento jurídico, planeava-se a insubordinação e a resistência…

Quão diferente era o aparelho!...


Nota: Fotos da manifestação de 29/5/2010 (300 000 na rua, contra a politica de Sócrates)

2 comentários:

  1. Excelente texto. E Obrigado!

    um dos sitiados

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  2. Subscrevo. Estive lá, sitiada e escoltada, sem direito nem sequer a ir à casa de banho, confirmo, como se de uma criminosa me tratasse. Por isso, em nome individual, já reclamei os meus direitos de cidadã baseando-me na Constituição da República Portuguesa e aconselho a todos os que estiveram na mesma situação a fazê-lo também.

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