Sendo uma ferramenta constitucional da nossa democracia representativa, o referendo tem sido instrumentalizado e servido como arma de arremesso - geralmente por quem está do contra – que como forma de resolver descriminações e problemas legislativos. Foi assim na questão do aborto, quando o padreca do Guterres foi na cantiga do maganão do prof Marcelo e fez a expiação dos seus “pecados” lançando a anátema da decisão sobre a matéria para cima de um povo pouco avesso a envolvimentos e participações desta natureza. Está a ser agora na questão do casamento entre pessoas do mesmo género. Neste segundo caso a questão coloca-se logo no universo dos subscritores da petição, cuja recolha incidiu no mundo bronco dos adeptos da bola; as recolhas das assinaturas ocorreram sobretudo nos estádios de futebol. Evidentemente que a opinião destes adeptos é tão valida quanto a minha, quanto a dos apoiantes e defensores do fim desta humilhante discriminação, porem estou ciente de que aquela ambiência é propensa a uma opinião grosseira, preconceituosa e condicionada a estereótipos ultrapassados e retrógrados que ofuscam a convicção e a reflexão.
Não é a democracia que move os defensores deste referendo, na realidade apenas querem condicionar e meter pedras na engrenagem. Até porque o problema não é uma questão de democracia, mas tão só de igualdade de direitos. Quando a democracia norteia as nossas vidas os direitos não são objecto de referendo ou de discussão, são pura e simplesmente normativos legais.
Sobre a matéria [casamento entre pessoas do mesmo género], já o escrevi, não aprecio, mas não tenho nem admito qualquer reserva mental ou legislativa. No que confere à adopção, apesar do “massacre” a que os meus filhos me sujeitam, defensores que são da inclusão dessa premissa no processo em curso, tenho algumas reservas, que admito preconceituosas, na medida em que envolvem uma terceira pessoa, regra geral em idade que não lhe permite decidir sobre a matéria. Neste particular, apenas por esta razão, tenho reservas, pelo que aceito que a matéria possa ser objecto de um debate mais aprofundado envolvendo técnicos e a sociedade civil antes de uma decisão.
Voltando ao referendo, sobretudo à petição enquanto ferramenta constitucional: Em meu entender deve ser reequacionando a sua validade e o seu papel enquanto instrumento de participação dos cidadãos, porque uma coisa é certa, a petição não pode ser boa quando nos é favorável e péssima quando nos é contrária. A democracia não se compadece com esses conceitos, tende a esmorecer tornando-se pálida… por vezes esfuma-se mesmo.
Os teus filhos batem-te bem na cabeça neste aspecto ;)...
ResponderEliminarNão percebo o teu argumento. A idade do menor, nesse caso, teria de valer para todos os candidatos a adoptantes, e não apenas para os CASAIS homossexuais. Um abraço.
Fernando, eu não estou a argumentar... escrevi apenas que não é matéria em que me sinto à vontade e por tal facto entendo que «possa ser objecto de um debate mais aprofundado envolvendo técnicos e a sociedade civil antes de uma decisão».
ResponderEliminarAdmiti até que possa ser preconceito meu, provavelmente é mesmo preconceito, porem não estou seguro que da parte contrária não haja soberba, insolência ou sobranceria intelectual, em suma excessos de sinal contrário aos dos que se opõem ao casamento entre pessoas do mesmo género. De sinal contrário, mas ainda assim excessos.
Excessos esses que, sabemos, não permitem a serenidade para a reflexão, antes pelo contrário pervertem-na com falsos pruridos e verdadeiros preconceitos sobre direitos estruturantes da sociedade democrática, livre e moderna. Os direitos estruturantes da sociedade em circunstância alguma podem ser objecto de referendo ou de discussão, são estruturantes… adiante…
Bom, posto isto apenas quero reclamar o direito a não ter os “horizontes tão abertos” quanto o dos meus filhos, camaradas e amigos; a ter o direito de, sem me opor, não ver com a mesma displicência, diria indolência, dos meus camaradas a questão da adopção.
Repara que eu não me opus, escrevi que tenho duvidas, reservas, muitas provavelmente… mas como também sou sensível aos argumentos dos meus filhos, dos meus camaradas e dos meus amigos… e estes não são ainda assim tão convincentes que me limpem o espírito as duvidas… longe de se desvanecerem… solidificam-se…
O problema deve continuar a ser meu… mas ainda bem que assim é, até porque – como tu próprio chegas-te a escrever ou a dizer – desconfio dos unanimismos… prefiro a sociedade onde a duvida persista no meio das certezas…
Até porque no que confere às certezas… às tais irreversíveis convicções, a história não tem muito com que se orgulhar…
Por ultimo, o post visava, mais que discutir a questão do casamento ou da adopção, abordar a problemática do referendo, nomeadamente perceber a sua importância enquanto ferramenta de expressão popular… «reequacionando a sua validade e o seu papel enquanto instrumento de participação dos cidadãos, porque uma coisa é certa, a petição não pode ser boa quando nos é favorável e péssima quando nos é contrária. A democracia não se compadece com esses conceitos, tende a esmorecer tornando-se pálida… por vezes esfuma-se mesmo.»
Abraço