segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Uma fábula que não é do reino animal

(…) Se eu mandasse neles / os teus trabalhadores / seriam uns amores: / greves eram só/ das seis e meia às sete, / em frente a um cassetete; / primeiro de Maio / só de quinze em quinze anos; / feriado em Abril, / só no dia dos Enganos (…)
Sérgio Godinho

Ou resolvemos no imediato a situação, nomeadamente contra-atacando com a exigência não apenas a reposição de direitos alcançados como ampliando o grau dos mesmos, ou estamos condenados a uma regressão civilizacional de contornos imprevisíveis.
Repare-se na histeria dos media, dos patrões, dos economistas e dos políticos neo-liberais a propósito do calendário de feriados para o ano 2011. Todos à uma, se preparam para mais um avançada nesta luta titânica entre os detentores dos meios de produção e os detentores da força de trabalho, leia-se patrões e trabalhadores sejam estes últimos detentores de contratos de trabalhos ou precários. Os primeiros Já estão a ganir, como cães esfaimados perseguindo a manada onde pressentem uma qualquer fraqueza, uma qualquer fragilidade. A pretexto dos feriados do calendário para o ano 2011, onde alguns deles podem proporcionar “pontes”, nomeadamente os que coincidem com as terças e quintas-feiras como são os casos do 20 de Abril, do 10 e 23 de Junho, do 15 de Agosto, do 1 de Novembro ou do 1 e 8 de Dezembro e eventualmente mais um ou outro, preparam-se para mais uma investida dura no que confere aos direitos de quem trabalha e produz riqueza. Já querem renegociar com a Santa Sé os feriados religiosos. Cavaco, já uma vez pretendeu legislar no sentido de suprir ou deslocalizar feriados nacionais. O 1º de Maio e o 25 de Abril estavam entre eles.
Curiosamente, calam-se como os ratos, no que confere aos feriados de 1 de Janeiro, de 25 de Abril, de 1 de Maio ou de 25 de Dezembro que coincidem com dias de descanso semanal.
Na vida real, os cães de fila são apenas isso, cães…
Espalhafatosos e barulhentos, não são sérios nem credíveis, são apenas serviçais que agitam e afugentam as manadas, desnorteando-as para que os verdadeiros predadores, as possam caçar isoladamente, sem os riscos que a força colectiva lhes pode causar.
Ah, os cães!... Pois, os propriamente ditos, da carne comem pouco, saciam-se com os ossos que sobram da refrega.
Fabulando ou não das duas uma; ou a manada continua a desvalorizar as investidas dos cães e estes executam livremente o seu papel, desfazendo a sua coesão e expondo-a às garras dos predadores, ou esta reinveste na força colectiva como garante da sua própria sobrevivência. Ao afugentar desde já a canzoada, mantém-se coesa para enfrentar os predadores.
Até porque no que confere à sobrevivência, as manadas não dependem dos predadores, são estes que dependem delas…

Também editado no "O Sono do Monstro"

1 comentário:

  1. No Facebook foram feitos alguns comentários acerca deste meu texto, nomeadamente acerca das expressões usadas, consideradas excessivas, sobre isso tenho a declarar o seguinte:
    Não creio que tenha exagerado na linguagem, fiz uma leitura efabulando com a vida animal, com vista a exemplificar o contexto de mais um ataque aos direitos do trabalho – mais um de entre muitos, diga-se – em favor dos mesmos de sempre.
    A questão de base é esta, perca de direitos por parte do mundo do trabalho, regressão civilizacional dos que vendem diariamente a sua força de trabalho, tenha ela a natureza que tiver, e ganhos do capital [acumuladores de riqueza se quiserem]. Tudo o resto é marginal.
    Ainda assim admito que o meu grito de alma, porque efectivamente se tratou disso, tratou-se de um grito, de um protesto – talvez intempestivo – possa ter melindrado algumas pessoas. Ao usar uma linguagem – como direi? – menos adequada ao combate politico palaciano, não quis nem quero atingir a honra ou a dignidade de ninguém. Também não pretendo nem pretendi atingir, quem de boa fé, defende pontos de vista diferentes dos meus. Mas por favor, não me pisem os calos.
    O meu verbo é grosseiro, básico, por vezes cáustico ou mesmo irritante?... Talvez!... mas que dizer de quem me vai aos bolsos? Que dizer da gestão politica que presenteia por exemplo com milhões a agiotagem do BPN e nos extorque o ordenado?
    Talvez pudesse ter recorrido ao uso de aspas; talvez pudesse adjectivar de forma mais suave; talvez pudesse usar “vozearia” em vez de “ganir”, talvez!... [Já agora esclareço que quando escrevi “como cães esfaimados”, limitei-me a estabelecer um paralelismo, nada mais que isso, a preposição “como” é de comparação e está lá para relacionar comportamentos. E toda a efabulação se enquadra na figura da comparação, nada mais que isso…].
    Talvez pudesse calar-me, emudecendo a minha angústia pela fúria neo-liberal, sem precedentes na nossa história contemporânea, que visa claramente a regressão social…
    Talvez pudesse silenciar o meu incómodo, talvez!... mas se o fizesse, esse não seria eu.

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